quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Ainda guardo com muito carinho a recordação daquele dia, lembra? O dia em que você tocou piano pra mim. Eu enrolado no edredom de pé descalço no chão e você de roupa íntima clara sentado ao piano tentando lembrar das notas. Lembra dos passeios pelo seu labirinto branco e do nosso cubo que por tantos lugares nos levou. Cubo ou máquina do tempo? Nem saberia dizer a diferença entre essas duas coisas, não como elas significaram pra nós dois. Agora, sem a sua referência, me sinto tão perdido, sabe? Tenho zilhões de coisas pra fazer, arrumar, arquitetar e executar... Mas a sua ausência insiste em me deixar de cama. Sinto meu corpo doente e pesado, sinto dificuldade em viver plenamente. Como se meus órgãos estivessem condenados a repousar e todo o resto com vontade de voltar pra terra.

Querido, de todas as coisas pelas quais passei, de todas as despedidas, de todas as ausências, você é a que mais me corta a pele. Dizem que os artistas sofrem mais, por isso mesmo até chego a confundir. Não sei se minha arte é o canto ou se é a arte de sofrer, já que esta última encaro com perfeição. Não sei se dou conta de começar tudo de novo, sabe? Alguém novo, manias novas, cheiros novos, beijos, enfim... uma série de circunstâncias que não me agradam. Nunca fui de gostar de mudanças, muitas vezes prefiro continuar no podridão do que ter que mover um músculo e dar início a um processo doloroso de readaptação.

Se todas essas reclamações servissem pra algo. Se toda vez que eu abrisse minha boca pra reclamar, se toda vez adiantasse algo, se valesse a pena... Mas não, nada. Nada, essa palavra é tão triste, tão vazia e ainda mais pra mim, que sempre adorei a sonoridade das coisas, sempre adorei pensar sobre o significado real de algumas palavras. Eu poderia dizer que não sinto nada, mas sinto, sinto muito... sinto tudo ao mesmo, me sinto mal. Sinto péssimo...

Tenho sonhado com você, tenho pensado muito, avaliado e reavaliado todas as situações. Não sei dizer o que me cativa ou me prende a você, só sei que é algo tão forte que é como se fizesse parte de mim. Tudo muito clichê, tudo muito conhecido. É difícil falar de amor sem que eu consiga me remeter ao brega, a toda normalidade. Sinceramente cheguei a pensar que essa era a minha hora, que tinha achado alguém pra vida, mesmo essa pessoa sendo tão diferente de mim. Em todos os sentidos. Desilusão é uma palavra tão amarga que não dá pra citá-la sem fechar a cara, por mais que você tente. E é este um dos vários sintomas que eu tenho sentido ultimamente dessa doença que é querer tanto você pra mim e só pra mim.

Tenho repetido nos últimos dias que estou em processo de cura, cura, cura... Que palavra linda! Mas não me sinto realmente em terapia. Não sinto que as coisas vão melhorar tão cedo e que eu vou conseguir acordar entusiasmado pra que o dia comece logo. Não me vejo mais como antes. Não sinto remorso por não me importar mais tanto com os outros, por não ser presença constante na vida de outrém. Não tenho mais a mínima condição mental de cuidar de alguém que não seja eu (ou você). E nesses momentos é que eu me vejo como um monstro. Eu não era assim, não era tão apático, tão sem amor as coisas, as pessoas.

Temo que daqui pro fim as coisas piorem mais. Tudo que eu quero nesse momento é ir, não por você, nem nada específico. É que eu não vejo mais graça nas coisas simples, não vejo mais graça nas grandes emoções. Cada vez mais me sinto perdendo o real significado das coisas que antes eram importantes, perdendo a noção das coisas e o amor a minha vida. Nenhum assunto me atrai, nadica! Nenhuma companhia tem me chamado realmente atenção pra sair de casa e me entorpecer. Sou só apatia: 1 Impassibilidade de espírito. 2 Indolência. 3 Teol Indiferença total em relação às coisas terrestres. 4 Filos Ausência de afetos e paixões. Antôn (acepção 2): vivacidade.

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