quinta-feira, 31 de julho de 2008

Sodomia

Eu não quero que gostem de mim apenas pela minha aparência. Não sou um pedaço de carne inanimado! Sou mais, palavras, gestos e faces. Quero sair sem me preocupar com a roupa que estou, com as olheiras aparentes. Não são apenas olheiras e nem apenas escadas abaixo das janelas da minha alma. São também parte de mim como pessoa, como bicho, como ser pensante. Eu quero que enxerguem o que há por trás, que saibam ler nas entrelinhas, que sosseguem os passos com a minha presença.

No final, eu quero mesmo é atenção dos passantes, dos amados, dos queridos. Daqueles que me olham e me despem pelo sorriso, pela calmaria, pelo humor ácido. Eu quero abraços perfumados, vozes pulsantes e tonadas. Quero tanto, tanto que essa vida perdure para viver intensamente os dias nublado - que eu tanto amo - e as pessoas.

Quero ouvir, quero falar, quero pensar. Compartilhar, acender, soprar, compactuar. Dos elos quero fazer verdadeiras correntes de chama viva que segue. Afagar os fios de cabelos preguiçosos e dar descanso aos pés cansados. Ó vida de sentimentos contrários, me bebe do frasco sem retoques, sem acabamento. Acaba com as minhas gotas por inteiro. Candeia!

Goste de mim, desgoste... não me prive, aceite. Faz de mim seu vinho do porto nas madrugadas desconcertantes. Me derrama no corpo, nos ossos nossos. Cura minha insanidade com carícias descaradas. Me enxerga como atuante primário de peripécias galopantes. Me enche de mel e aveia e me come com som de um trovão.

Degusta a todo custo os meus disfarces sofridos de pobre diabo. Hablo, que tal? Uma dose, um pileque, comportemo-nos com moral. Seres pensantes de asas grandes que incessantemente levantam da queda e não se abalam por tão pouco. Mostra-me que tudo isso tem muito mais pra ser lapidado, nas pequenas coisas dá-me o alimento para regozijar meu espírito.

Namora-me como se eu fosse o último e mais belo dos pássaros, não pela minha pelagem, mas pelo meu teor como espécie. Abra os olhos e me veja como sou. Os pêlos, veludo, dedos e janelas. Encoraja-me como propriedade sua, limpe minha mediocridade e ranha minhas feridas. Exponha-as, ensina-me, doe-se, faça de mim segundo o vosso desejo para que eu seja salvo.

3 comentários:

Irlla Narel disse...

CHEGA uma hora que estamos aqui e queremos ser vistos. Eu sei o que é isso, só quero ser vista...

Daniela Andrade disse...

Minha nossa, minha mãe. Que texto belo. Parabéns.

Anônimo disse...

=D